Armadura é armadilha. Escudo é preservação.

Somos todos prisioneiros. Fomos engolidos por histórias familiares atuais e transgeracionais. A sobrevivência falou mais alto. Com a sobrevivência vêm as primeiras sementes da armadura/armadilha. “Não pedi este nome, nem esta crença e, muito menos, para viver neste lugar”.

Aprendi que é assim: no início oferecem algo que é necessário para tirar você do desamparo inicial e da desproteção. Basta ser politicamente correto, bonzinho que, no final, tudo vai dar certo.

Armadilha pura. Para você não ser você basta aceitar o que lhe dão e agradecer. Afinal, sobreviver é preciso, caso não queira perecer. Como sobreviver sem enrijecer? Quando começamos a enrijecer nossas armaduras começam a ser construídas. A armadura é uma armadilha ou não é?

A armadilha toma conta do nosso organismo, corpo e mente criando uma química doentia, transformando seres humanos em robôs – ou zumbis. A armadura, que era uma “saída” para sobrevivermos, mata nossas emoções.

A necessidade de amparo e proteção, diante da dor de se constituir como ser humano, transformou alguns de nós em seres pragmáticos, especialistas em soluções racionais. A razão passou a ser a nossa verdade. Criamos e desenvolvemos uma máscara para cobrir nossas emoções, como a do personagem do filme “O homem da máscara de ferro”. Ao tirá-la, é possível que as marcas já estejam incrustadas na nossa alma (psique), sem precisar mais usá-las.

Que tal se desfazer das máscaras e apoderar-se de escudos? Estes sim nos preservam quando precisamos nos defender. Os escudos estão mais próximos dos nossos instintos de preservação. Em algum momento da vida precisamos usar do mecanismo de rigidez para sobreviver à morte de um ente querido, a separações, falências, doenças graves. Mas se ao invés disso optássemos pelos escudos? Porque em ocasiões assim, usando armaduras, perdemos parte da nossa docilidade e sensibilidade, de esperança e crença no amor próprio e do outro por nós.

Encontro pessoas que viveram perdas significativas, que vivenciaram dores tão intensas que se perderam em si mesmas, construindo barreiras emocionais que as distanciaram do sentido de suas vidas. Passaram a dirigir seu destino como alguém que dirige um carro com o “freio de mão puxado”.

É hora de nos revermos, de transformar nossas armaduras cobertas de sofrimentos e dores em escudos com brilhos de afeto, amor e carinho pela vida. Um ser que usa escudo é um ser resiliente. O que veste a armadura tem grande possibilidade de ficar doente. O excesso de defesa cria o chamamos de pseudoself ou falso “eu”, um modus operandi que protege a pessoa dela mesma, enquanto vive desconectada de suas emoções. Pessoas que, após tempo, se perguntam onde estavam que não perceberam que viveram distantes delas mesmas, por longo período ou vida inteira. Pessoas que não sabem o que gostam, não sentem os prazeres da vida e lidam mal com o lazer.

Se você ainda não trocou a sua armadura por um escudo, ainda é tempo. Afinal, só você tem os recursos e as ferramentas para desconstruir sua armadura. Basta limpar o coração do ódio, rancor, vingança, da agressividade e compreender esse outro que lhe acompanha na sua jornada, um empréstimo do Criador para o seu processo de evolução.

Faça as pazes consigo mesmo. Quando isso acontecer, escreva uma carta para você. Isso mesmo: de você para você. Fale tudo o que gostaria de ter dito a si mesmo ao longo da vida e, por tantas defesas, não falou. Um exemplo: a quantas coisas gostaria de ter dito “não” e disse “sim”, só para não desagradar?

Escreva com o coração, porque a razão, nessas horas, só serve para atrapalhar. Use da autenticidade, seja gentil com você, porque você merece.

Sebastião Souza
Psicoterapeuta de casais e famílias

Baixa imunidade emocional mata

Evitar o contato com crises, conflitos ou insucessos é uma forma de morrer em doses homeopáticas.

O medo do fracasso, o terror, a frustração e a baixa intolerância no trato com outro são ingredientes facilitadores da morte em vida. Começamos a morrer quando o sentimento de desamparo passa a ser uma parte significativa de nossas relações pessoais e profissionais, dando sentido às nossas atitudes, ações e manifestações comportamentais.

A falta de respostas acalentadoras, que possam acalmar a mente no caos, faz com que dias e noites pareçam intermináveis frente às dores desconhecidas que a vida impõe, causando um quadro de apatia. Dores que, por vezes, parecem transcender à condição humana, como a perda ou a iminência da ausência do pai, mãe, filho, amigo… Dores impossíveis de serem compreendidas, mas que servem de remédio para aumentar a nossa imunidade emocional.

Os sentimentos de impotência e desamparo podem matar, mas, também, podem ser fontes de curas para quem acreditar que a aprendizagem é uma das poucas competências que imuniza o ser humano no seu processo de evolução da vida para a morte.

Vivemos como eternos aprendizes, com baixas imunidades emocionais, já que, ao final, somos vencidos por uma morte sábia/ignorante, que aguarda de braços abertos todos os que passaram pela vida sem usar seus potenciais máximos, nas relações pessoais, profissionais, nas suas famílias e nos casamentos.

Viver é aprender. Aprender é criar imunidade emocional nas nossas experiências relacionais. Essa aprendizagem promove o caos, a ansiedade dilacerante ou até, em alguns casos, angústia catastrófica, troca do velho pelo novo, fazendo o aprendiz se sentir “sem lenço, sem documento”. As experiências frustradas que vivemos são fontes enriquecedoras de imunidades emocionais, ajudando-nos a ser potencialmente imunes e resilientes. Nossas experiências caminham de mãos dadas com nossas aprendizagens e essa interação nos imuniza frente às adversidades e circunstâncias da vida.

A baixa imunidade emocional é prima do desamparo, irmã da depressão e mãe conciliadora da morte. Conciliadora porque entre vida e morte não existe saída, porque o vencedor é predefinido. Então resta conciliar.

O desamparo é o início do processo de depressão, salvo as heranças genéticas. É a própria consolidação da entrega à desesperança e falta de sentido na vida. É por meio do desamparo e da depressão que se inicia o nosso mecanismo de defesa, de cisão entre as nossas razões e emoções. Para fugir das possíveis dores emocionais avassaladoras da vida, como o diagnóstico de uma doença terminal, nós usamos a razão patológica como proteção para não encara que, ao final, a morte sempre vence.

A consciência de finitude é uma das maiores fontes de imunidades emocionais que podemos adquirir. A morte traz imunidade para aqueles que, em vida, apreendem com suas famílias, casamentos, na vida pessoal, profissional e com os amigos, compreendendo que imunidade emocional é semelhante ao processo de algumas vacinas. É preciso entrar em contato com os malefícios dos corpos estranhos (algumas vezes venenos) em doses homeopáticas para sair imunizado.

Na vida também é assim: quem deseja adquirir certa imunidade emocional, precisa encarar que a vida foi nos dada de graça, para aprendermos a ser melhores a cada dia. É a morte que confere plenitude à vida.

AGORA É COM VOCÊ

Faça uma lista contendo as circunstâncias e pessoas com quem convive (família, casamento, profissão, amizades).

Dê uma nota de 0 a 10 para definir como você está cuidando da sua imunidade emocional em cada um desses contextos.

Caso você se dê uma nota 0, é porque já nasceu morto e não sabia.

Caso tenha atribuído uma nota 10, acabou de morrer e também não sabe.

Quem confere aprendizado ou imunidade ao ser humano é a sua incompletude. Por acaso, você gostaria de já estar completo?

Bom teste!

Um abraço a todos.

Sebastião Souza
Psicoterapeuta de casais e famílias